Pré-projeto de doutorado idealizado para a disciplina Fundamentos em Ecologia de Paisagens ministrada pelo Prof. Dr. Milton Cezar Ribeiro @ UNESP/IB Rio Claro.
Introdução
Com o avanço das ações antrópicas na ocupação do solo, estão ocorrendo pressões deletérias sobre os habitats e as espécies que neles vivem. É característico dos psitacídeos a nidificação em ocos de árvores, cuja frequência relativa de ocorrência é baixa, sobretudo para as cavidade maiores que abrigam os psitacídeos de maior porte. Sob a hipótese da continuidade do avanço desarrazoado do desmatamento decorrente da expansão do agronegócio e do fogo que limitaria esse espaço de nidificação ainda mais, pode a paisagem urbana e rural, com a integração de ninhos artificiais, se tornar um refúgio de nidificação para os psitacídeos de médio e grande porte?
Há duas motivações que permeiam essa possibilidade: a adaptação observada do periquitão/maritaca à nidificação em edificações urbanas/rurais e a cultura brasileira de proximidade com os psitacídeos.
Desse modo, propõe-se utilizar os fundamentos de ecologia de paisagens para analisar e modelar o problema.
Parte 1 - Pesquisa básica.
Para subsidiar a proposta de integração de ninhos artificiais ao ambiente urbano/rural, é necessário compreender como a paisagem atual interfere na ocupação de ninhos (postura) e na taxa de sucesso da saída dos filhotes do ninho (sucesso populacional) de 3 ssp. de psitacídeos de portes distintos, incluindo o periquitão/maritaca, que já se observa uma integração ao ambiente urbano/rural.
Em uma primeira análise, a nidificação e desenvolvimento dos filhotes pressupõe a existência de abrigo (ninho), temperatura (chocar) e alimentação (aporte nutricional), bem como o efeito negativo de predadores.
Convém rever na bibliografia existente:
- Os fatores a/bióticos e seus efeitos na nidificação, postura e desenvolvimento dos filhotes de psitacídeos.
- A adaptação do periquitão/maritaca ao ambiente urbano/rural.
- A movimentação entre ninho e fonte de alimento e entre área de reprodução e área de nidificação.
- Aplicações de ecologia de paisagem específicas aos psitacídeos
Métodos/Checklist:
- Delimitar ssps.: 3 psitacídeos = {psittacara leucophthalmus (pequeno), amazona aestiva (médio), ara ararauna (grande)} em razão do fator tamanho.
- Delimitar local: Cerrado MS/MT/GO, área em que as 3 ssp ocorrem simultaneamente para bloquear fatores externos. Incluir urbano, rural e vegetação nativa.
- Selecionar idade/período das imagens: início, meio e fim da estação reprodutiva.
- Selecionar espectros das imagens: RGB (classif dos elementos), Uv (se sensível), IR se calor relevante para sel. do local do ninho.
- Selecionar resolução das imagens. Obs: para o periquitão, incluir o tipo de construção como elemento de heterogeneidade da paisagem, portanto não maior que 10m.
- Obtenção das Imagens do local (satélite, mapa, aerofotografia, etc).
- Incluir camadas de informação extras:
- abióticas (temperatura, vento, química)
- bióticas (alimentação, predação – i.e. felinos)
- de sentidos do animal (ex. sons, cheiro); e
- veterinárias (saúde, genética, etc)
- Desenho experimental / Localizar pontos amostrais (estimativa geral e refino a posteriori) e tamanho do buffer (escala): modelo estatistico, homogeneização dos fatores, aleatorização, réplicas ou DOE.
- Seleção da dist. entre pontos amostrais (obs: limitará à 1/2 da max escala de efeito)
- Classif heterogeneidade da paisagem.
- Extrair métricas da paisagem (composição, configuração, interações)
- Incluir as camadas de informações das variáveis dependentes (i.e obtidas em campo)
- Realizar as análises estatísticas: outliers, critério de convergência de escala?, verif IID, exploratória PCA, regressão/ANOVA, ML, inferência, limiares
Alguns fatores sugeridos:
- no urbano/rural: tipo de edificação (classificação por imagem), densidade populacional de felinos (pesquisa tipo votação?)
- na vegetação nativa: densidade de ninhos naturais, densidade de alimentos
- tamanho do psitacídeo = {peq, med, grande}
- Imagem UV
- Imagem IR
- Paisagem:
- Composição:
- Área de cada classe
- Configuração:
- Shannon
- Borda
- FFT Respostas sugeridas:
- Composição:
- Se houve postura no ninho
- Se houve problema no ovo (predação, má formação, etc)
- Qtde filhotes voaram
- Estado de saúde dos genitores e filhotes
Parte 2 - Fronteira do conhecimento teórico-conceitual-metodológico
Ainda, convém verificar se existem e quais os valores de limiares de parâmetros de paisagem de não retorno populacional, ou seja, a partir do qual a proposta de intervenção com ninhos artificiais se tornaria crucial para manutenção da espécie? Entretanto convém refinar o conceito de limiar para aplicação em tomada de decisão. Atualmente o conceito de limiar está estabelecido para inferência (observação da característica da população) (Huggett 2005, Briske et al 2006) entretanto, para a tomada de decisão, pode ser interessante defini-lo em termos probabilísticos. Por exemplo, considerando um gráfico de riqueza de espécies e fragmentação. Para garantir a biodiversidade pode ser desejável que a cada 10 amostras aleatórias da paisagem, pelo menos 9 tenham riqueza superior ou igual 5. Qual seria valor mínimo tolerável da fragmentação para atender essa condição mínima? Ou seja, resolver o problema: P( Riqueza > 5 | Fragmentação < Fragmentação_limite ) > 9/10?
Parte 3 - Proposta de intervenção
Por fim, propõe-se utilizar os fundamentos da ecologia de paisagens bem como o aprendizado das partes 1 e 2 para elaborar um projeto piloto de implantação de ninhos artificiais urbanos e rurais para psitacídeos de médio e grande porte.
Espera-se com isso:
- verificar o potencial de integração/adaptação ao ambiente urbano e rural de psitacídeos maiores que o periquitão/maritaca
- verificar o potencial de mudança cultural na população pela transposição da ideia de psitacídeo em cativeiro para psitacídeo livre em ninhos e como essa mudança cultural afetaria o tráfico e comércio dessas espécies
Algumas etapas propostas:
- Avaliação do projeto em comitê de ética.
- Identificar/modelar os spots urbanos e rurais mais promissores e os que devem ser evitados para a instalação do ninhos artificiais.
- Ao final do projeto, avaliar como a paisagem interfere na ocupação dos ninhos artificias (postura) e na taxa de sucesso da saída dos filhotes do ninho artificial (sucesso populacional) e comparar com os resultados para parte 1.
- Integração com projetos já existentes (exemplo: arara-azul, papagaio-verdadeiro).
- Promoção de ações educativas estratégicas na cidades visando a transformação da cultura de cativeiro para ninho, mostrando as vantagens do ninho para o cativeiro e os benefícios para a saúde mental de um contato mais próximo à natureza.
- Identificação de desafios como potenciais problemas veterinários e a movimentação para busca de alimento.
Assim, se aproximar da reposta à pergunta feita inicialmente: com a integração de ninhos artificiais, pode a paisagem urbana e rural se tornar um refúgio de nidificação para os psitacídeos de médio e grande porte? Ainda, observar como isso afetaria o problema do tráfico das espécies.